terça-feira, 22 de maio de 2012

Indenização por abandono afetivo. Quanto vale o “bom dia” não ouvido, o beijo não recebido, o abraço ausente de uma figura que deveria ser exemplo?



Monique Leal Cesari

SUMÁRIO: 1 – Introdução; 2 – Definição de Família; 3 – Responsabilidade familiar defesa em lei; 4 – Danos psicossociológicos causados à pessoa; 5 – Casos práticos; 6 – Conclusão; 7 – Bibliografia.

      1.      Introdução
Causando grande polêmica, e sendo este um tema não muito discutido até a pouco tempo atrás, o assunto “indenização por abandono afetivo” traz muita divergência de opiniões dos tribunais brasileiros.
O presente estudo tem por objetivo analisar até que ponto pode-se valorar a falta da afetividade familiar, e os prejuízos causados para a personalidade de quem conviveu com a distância, com a ausência do amor paterno ou materno, carência na educação, no companheirismo, na convivência do dia-a-dia, e com a falta da personalidade exemplar que os pais deveriam ser para seus filhos.
A seguir, verificaremos a importância de o Direito andar lado a lado com a psicologia, a sociologia, entre outras ciências de fundamental importância para analisar os aspectos pessoais e íntimos de cada indivíduo, garantindo-lhes melhores resultados nas sentenças, mostrando cada vez mais um Direito caminhando para o bem comum, mas que também valoriza o indivíduo como único e essencial para o bom funcionamento do todo.

      2.      Família
Primeiramente trataremos a definição de família para o nosso Direito, tendo hoje, no Brasil, uma visão menos tradicionalista e preconceituosa trazida pelo nosso código civil de 1916, até que fosse revogado pelo código de 2002.
A família, atualmente, é tratada de maneira mais ampla, dependendo muitas vezes de interpretação pessoal, pois nossa visão deve ir muito mais além do que apenas aquilo que está tratado na letra da lei, ela deve caminhar junto com as mudanças e evoluções cotidianas e com maneira das novas sociedades se organizarem.
A lei está muito mais abrangente, e fora dela as interpretações estão cada vez mais expansivas. Hoje, entre outras formas de família, é defeso em lei a constituição familiar por qualquer dos pais e seus descendentes, já é aceito também a união homoafetiva reconhecida publicamente (assim como é exigido na união estável) onde podemos exemplificar casos de homossexuais que adotaram filhos onde na certidão de nascimento da criança consta o nome de dois pais, como no caso publicado na revista Crescer:
”Nossa "gestação" começou no dia 3 de junho de 2005, quando a Justiça de Catanduva, cidade no interior de São Paulo, nos autorizou a entrar na fila da adoção. Após 13 anos de união, decidimos que era hora de ampliar a família. Como todo relacionamento, o nosso também teve fases. Namoramos, casamos e sentimos a necessidade de dar continuidade à nossa relação. Só uma criança teria essa capacidade. Fomos então pedir permissão à Justiça. A rápida decisão favorável surpreendeu...”.
(Vasco Pedro da Gama Filho, 35 anos, e Dorival Pereira de Carvalho Júnior, 43 anos, cabeleireiros, colunistas sociais e donos de uma agência de modelos, são pais de Theodora, 5 anos, Catanduva, SP – Revista crescer.globo.com)
Amplo está o campo de aceitação familiar, que muitas vezes não está expresso em lei, mais está na concepção de cada um, e na forma de aceitar a realidade como ela se encontra, e não querer mascará-la e pré molda-la, pois a família surge, muitos mais do que de laços sanguíneos, de laços afetivos.

      3.      Responsabilidade Familiar defesa em lei
Partindo da premissa de que a paternidade ou maternidade não geram apenas deveres de assistência material, muito se tem discutido a respeito da responsabilidade familiar, e os deveres dos pais para com seus filhos em aspectos afetivos.
Muito além de questões financeiras, existe um dever dos pais, que mesmo alternadamente, devam ter seus filhos próximos e acompanhá-los em sua formação, tanto social, quanto moral, quanto religiosa. Ajudando-os em sua auto afirmação no mundo, visto que as questões familiares possuem um importante simbolismo cultural para a sociedade.
Para nos aprofundarmos mais na questão, precisamos analisar o que a Constituição Federal de 88 traz como responsabilidades e obrigações devidas dos pais para os filhos.
No capítulo VII, DA FAMÍLIA, DA CRIANÇA DO ADOLESCENTE E DO IDOSO, no caput do artigo 227 está disposto:
            “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Analisando este artigo podemos observar que é dever da família assegurar entre outras coisas, a convivência familiar e privá-los da discriminação, onde podemos chegar a um ponto de vista de que a ausência de um dos pais pode causar prejuízos na educação, discriminação pelos colegas, ausência da figura exemplar que deveria ensiná-lo, incentivá-lo nas ações cotidianas, conversar, aconselhar e defendê-lo em situações diversas.
Quanto à ausência do apoio financeiro, este também deixa uma lacuna onde o filho poderia ter tido melhores oportunidades de crescer intelectualmente, pois embora seja dever do Estado garantir saúde e educação, sabemos que este deixa a desejar, pois não cumpre seu papel como deveria, restando como alternativa buscarmos planos de saúde com preços exorbitantes, escolas particulares, cursos preparatórios para o mundo do trabalho que está cada vez mais concorrido, cursos superiores, etc. Concluindo que um apoio financeiro a mais é sempre necessário, principalmente se tratando dos próprios pais, que embora não queiram ou não possam participar da vida cotidiana de seus filhos ainda sim estão obrigados a auxilia-los, assim como está disposto no §6º do artigo 227:
            “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.”

     4.      Danos psicossociológicos causados à pessoa
De acordo com estudos psicológicos feitos por estudiosos no assunto, foi mostrado que a má formação da estrutura familiar compromete o desenvolvimento das pessoas, pois para se alcançar uma estruturação sadia é necessário que os pais tenham uma personalidade equilibrada, capazes de lidar com conflitos do cotidiano propiciando um ambiente adequado, e que na falta deste pode influenciar negativamente na vida da criança e do adolescente.
Essas influências repercutem em vários ramos da vida da pessoa, seja na escola enquanto criança, intelectualmente, nas relações interpessoais e principalmente na vida adulta, que é quanto esta passa a entender e analisar as cicatrizes deixadas ao longo do tempo. Nesse estudo psicológico detectamos três aspectos que mais levam as pessoas à criminalidade e a prejudicar a sociedade de alguma forma, são eles:
·         Filosófico - banalizando a vida em sociedade, valorizando o materialismo e o consumismo;
·         Policial;
·         Social (e o principal para nós) – exclusão dos jovens, tonando-os presas fáceis.
Podemos observar então, que os danos podem ter repercussões não somente para o indivíduo, mais sim para a sociedade, afetando muitas vezes os entes mais próximos. Vejamos a seguir o depoimento do psicanalista Sergio Nick sobre o assunto:

“...os filhos abandonados total ou parcialmente pelo pai tem dificuldades de lidar com sentimentos gerados por este abandono, o que vai trazer consequências imprevisíveis. Estas crianças apresentam um núcleo depressivo que pode levá-las a sentimentos de baixa auto estima, de não serem merecedoras de amor...”

Deve este ser um assunto profundamente analisado em casos de ações como as que serão citadas em capítulos posteriores, pois só analisando os danos psicológicos, recentes e passados, da pessoa é que se poderá chegar a um valor justo de indenização, não devendo ser medido apenas os prejuízos financeiros que esta teve ou o que deixou de ganhar.
“Se crianças não recebem a devida atenção, em geral, quando adultas, têm dificuldades de amar seus semelhantes.” (DALAI LAMA, 1999).

      5.      Casos práticos
Já se têm notícias de vários casos com esse tipo de ação, alguns com sentenças favoráveis outros não.
Um deles ocorreu em Minas Gerais, onde o Supremo Tribunal Federal condenou o pai por abandono moral de seu filho, pois este queria apenas amor e reconhecimento, e não teve a figura paterna em datas importantes de sua vida.
Outro, de uma cidade no Rio Grande do Sul, foi obrigado a pagar 200 salários mínimos para sua filha, sob a decisão do juiz de Direito da comarca de Capão da Canoa, alegando tê-la abandonado moral e financeiramente. Salientou ainda na sentença que “a educação abrange não somente a escolaridade, mas também a convivência familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao parque, jogar futebol, brincar, passear, visitar, estabelecer paradigmas, criar condições para que a criança se auto – afirme”.
O terceiro e mais atual, um pai foi condenado a pagar uma quantia de 200 mil reais após ser confirmada a paternidade. De início a caso foi julgada improcedente, no entanto, no Superior Tribunal de Justiça a ministra Nancy Andrigh reconheceu o abandono, e que o pai tinha condições de auxiliar a filha, que muito sofreu se considerando como “filha de segunda classe”. A ministra afirmou ainda que “amar é faculdade, cuidar é dever”.

      6.      Conclusão
Não há restrições legais para a aplicação das regras relativas à responsabilidade civil no direito de família, por isso há tantas controvérsias e divergências de opiniões nesse assunto.
No entanto deve-se ser mais “humano” para analisar esses tipos de caso, porém nunca perder a racionalidade. Cada caso haverá seus problemas, seus danos, seus prejuízos, etc. Por isso não se pode generalizar que todas as ações desse tipo terão a mesma sentença, pelo contrário, principalmente pelo fato de ter de se analisar aspectos pessoais e psicológicos, que se manifestam de maneiras diversas em cada um.
 Mostramos aqui casos que foram sentenciados de maneira positiva para os filhos, mais na maioria das vezes não é assim, sendo que muitos buscam o recurso para se aproveitar da situação. Alguns pais alegam até mesmo que as mães das crianças não permitiram o contato, no entanto se havia um real interesse, deveria ele ter tomado providências, pois além de obrigações os pais possuem também direitos em relação aos seus filhos.

      7.      Bibliografia
MACHADO, Paulo Afonso Leme; MACHADO, Maria Regina Marroco. Direito do Planejamento Familiar.
NERY JUNIOR, Nelson e ANDRADE NERY, Rosa Maria. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. 2ª Ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
FLORES, Vanda de Souza. Traumas da infância e suas consequências nas várias etapas da existência humana – Instituto Superior de Ciências da Saúde. Salvador - BA, 2008.
 ASSIS, Edson. Quanto vale o dano moral causado pelo abandono do pai? Disponível em: http://www.edsondeassis.com.br/pais-e-filhos, acesso em 12/05/2012
Decisão inédita do STJ, sobre abandono afetivo. Disponível em: http://noticias.uol.com.br/cotidiano

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